Nesta época em que o calendário ocidental celebra as festas de Final de Ano, lembro-me de um exercício etnográfico que realizei há muitos anos, ainda estudante de Antropologia. Ao extremo sul, do hemisfério austral observei uma sociedade de comportamentos bem peculiares, com cerimônias profundamente ritualizadas e repletas de significados. Podem nos parecer estranhos, mas isso dependerá da capacidade de cada um em considerar as verdades da vida menos como uma questão de essência e muito mais como uma questão de pontos de vista.
Nessa sociedade, com em todo o Ocidente, o conceito de calendário é cíclico, e num determinado dia, de cada ciclo, eles reverenciam a "renovação". Nesse dia, reúnem-se ao pé de um grande arbusto, todo decorado para a cerimônia, e ali festejam o nascer de um novo período. O próprio nome desse dia remete à etimologia de seu significado, o nascimento, a Natividade.
Essa sociedade é muito, muito religiosa, e no referido dia destinado ao culto de reverência à "Natividade", muitas famílias rumam para um culto litúrgico e lá assistem a uma cerimônia. Cantam em pé, rezam genuflexas, e depois de realizar a oitiva sentadas, de uma narrativa sagrada, ao final da referida liturgia, simbolicamente bebem o sangue e devoram o corpo de seu deus, o deus que renasce naquele dia.
Um dos símbolos mais adorados por eles é uma re-apropriação sagrada de um instrumento de tortura que remonta a Antiguidade. Instrumento esse curiosamente usado num passado remoto, de forma crucial, para sacrifício e morte de quem vieram a acreditar depois que fosse a encarnação viva da sua divindade sagrada e celebrada nesse dia.
No dia seguinte à noite da liturgia sagrada, as famílias inteiras reúnem-se em seus domicílios, onde em cerimônias que misturam rituais sagrados e profanos, juntam-se em volta de fogueiras para consumir, de diferentes formas, cadáveres de diversas espécies de animais cozidos. Uma especiaria muito peculiar entre eles é uma pequena víscera cardíaca de uma ave doméstica, degustada em pequenas porções.
Outra especiaria bastante popular é uma espécie de alimento - que mistura gordura, carnes de diversos animais e condimentos - embutido em condutos do trato final do sistema digestivo, desses próprios animais. Para acompanhar o alimento sólido, bebem infusões de diferentes variedades. Algumas, misturam ervas com água aquecida, outras, misturam alucinógenos preparados a partir de vegetais misturados, destilados ou fermentados.
Mais alguém aí conhece essa "estranha" sociedade?